segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Like A Rolling Stone

Quem nunca se sentiu como uma pedra que rola*? Ou quem não passou por mudanças drásticas na vida social, profissional ou pessoal? Pois é, e foi analisando o clássico do mestre Robert Allen Zimmerman, mais conhecido como Bob Dylan, que podemos ver da forma mais que poética, a trajetória da Miss Lonely(como a protagonista da canção é chamada). Essa experiência da "Srta. Solitária" serve de metáfora para expressar temas sensíveis à vida na sociedade contemporânea(como o materialismo e o universo das aparências), e fazer um questionamento contundente de valores dominantes.

Logo no primeiro verso, a ironia de usar um começo típico dos contos de fadas – Era uma vez (Once upon a time) – é um recurso que introduz um dos temas centrais da canção: a ilusão. A Srta. Solitária é retratada como alguém que vivia uma vida de riquezas materiais, ostentação e desprezo por tudo que estivesse fora de seu mundo. Além de sua caracterização pela aparência como uma pessoa que pertencia ou que freqüentava as classes altas, os versos revelam também seu modo de ser arrogante e prepotente. A perda dos seus bens leva-a para dentro de um universo que sempre desprezou e que não sabia como lidar. A trajetória da Srta. Solitária é uma poderosa metáfora para o caminho percorrido por alguém que vai da ilusão para a realidade, que sai do universo das aparências para adentrar o da verdade. A desilusão da Srta. Solitária é a sua forma de atingir o entendimento, de tornar-se consciente do que estava ao seu redor.
Nos anos 60, a opulenta sociedade norte-americana, do consumo, do acúmulo de riquezas e da valorização das aparências, enfrentava suas contradições mais profundas: a segregação racial, a Guerra no Vietnã, o florescer de uma cultura que contestava o “american way of life” e que tinha raízes na cultura negra do sul pobre.
Entre as várias interpretações possíveis, “Like a Rolling Stone” pode ser vista como uma metáfora sobre essa sociedade que sai da ilusão dos seus idílicos anos dourados (a exuberância do pós-Segunda Guerra Mundial e dos anos 50) para encontrar uma dura realidade de um outro mundo fora dos Estados Unidos (a tragédia no Vietnã e a ameaça da destruição nuclear) e também dentro do próprio país (o assassinato de John Kennedy, o racismo e a pobreza da população negra, a contracultura).

Mas a trajetória da Srta. Solitária não é apenas para revelar essas contradições entre ilusão e realidade. Em canções anteriores gravadas por Hank Williams e Muddy Waters, “rolling stone” era uma expressão para retratar alguém perdido, errante e solitário, vivendo uma vida de “pecados”.

Em “Like a Rolling Stone” (independente das associações que podemos fazer hoje com a história da banda The Rolling Stones), Bob Dylan transporta a figura do “rolling stone” para o refrão e na forma de indagação quer saber da Srta. Solitária como é se sentir como uma pedra rolante, sem lar, sem direção e completamente desconhecida. “Like a Rolling Stone” fala essencialmente sobre como a desilusão e o entendimento podem ser libertadores. Sem amarras, sem ter mais o que perder, sem destino, sem a necessidade de ter ou aparentar ter, crescendo e descobrindo que a vida não é exatamente como aparentava ser ou como lhe disseram que era, a Srta. Solitária na verdade tem a chance de se libertar.

Esta é apenas uma das interpretações possíveis sobre "Like a Rolling Stone", a de uma canção
sobre a possibilidade de uma geração caminhar em direção à liberdade, superar os valores impostos por uma sociedade onde o que importa é o dinheiro e o status, ainda que este seja um caminho solitário e doloroso. Bob Dylan pode ter composto outras canções com o mesmo brilho e profundidade poética que “Like a Rolling Stone” mas foi ela quem mudou definitivamente o caminho do rock.

Para assistir (em DVD): - No Direction Home (direção Martin Scorsese, 2005)
- Don´t Look Back (direção D.A. Pennebaker, 2007)

Para ler: -
COTT, Jonahtan. Bob Dylan: the essential interviews. Wenner, 2007.
- IRWIN, Collin. Legendary sessions: Bob Dylan. Billboard Books, 2008.
- MARCUS, Greil. Like a Rolling Stone: Bob Dylan at crossroad. Faber&Faber, 2005.
- SOUNES, Howard. Dylan – a Biografia (tradução de Leila de Souza Mendes). São Paulo: Conrad, 2007.

* Rolling Stone = (pedra que rola) vem da expressão ‘uma pedra que rola não carrega limo’ (a rolling stone carries no moss). Uma vez que limo somente se dá em local sedimentado, a metáfora sugere uma pessoa que não tem paradeiro certo e que geralmente não fica muito tempo em lugar algum. Em português, costuma-se dizer que uma pessoa assim ‘não tem raiz’, substituindo a metáfora da pedra pela da planta.

Adaptação do texo de Sílvio Anaz. "HowStuffWorks - Como funciona Bob Dylan". Publicado em 07 de fevereiro de 2008 (atualizado em 19 de maio de 2008) http://lazer.hsw.uol.com.br/bob-dylan3.htm (22 de dezembro de 2008)

Like A Rolling Stone
Bob Dylan

Once upon a time you dressed so fine
You threw the bums a dime in your prime, didn't you?
People'd call, say, "Beware doll, you're bound to fall"
You thought they were all kiddin' you
You used to laugh about
Everybody that was hangin' out
Now you don't talk so loud
Now you don't seem so proud
About having to be scrounging for your next meal.

How does it feel
How does it feel
To be without a home
Like a complete unknown
Like a rolling stone?

You've gone to the finest school all right, Miss Lonely
But you know you only used to get juiced in it
And nobody has ever taught you how to live on the street
And now you find out you're gonna have to get used to it
You said you'd never compromise
With the mystery tramp, but now you realize
He's not selling any alibis
As you stare into the vacuum of his eyes
And ask him do you want to make a deal?

How does it feel
How does it feel
To be on your own
With no direction home
Like a complete unknown
Like a rolling stone?
You never turned around to see the frowns on the jugglers and the clowns
When they all did tricks for you
You never understood that it ain't no good
You shouldn't let other people get your kicks for you
You used to ride on the chrome horse with your diplomat
Who carried on his shoulder a Siamese cat
Ain't it hard when you discover that
He really wasn't where it's at
After he took from you everything he could steal.
How does it feel
How does it feel
To be on your own
With no direction home
Like a complete unknown
Like a rolling stone?
Princess on the steeple and all the pretty people
They're drinkin', thinkin' that they got it made
Exchanging all kinds of precious gifts and things
But you'd better lift your diamond ring, you'd better pawn it babe
You used to be so amused
At Napoleon in rags and the language that he used
Go to him now, he calls you, you can't refuse
When you got nothing, you got nothing to lose
You're invisible now, you got no secrets to conceal.

How does it feel
How does it feel
To be on your own
With no direction home
Like a complete unknown
Like a rolling stone?